No campo o menino caminhava. Ouvia o som do vento e sentia o cheiro de grama. Estava cedo. O sol ainda não havia nascido e o mundo era coberto por uma luz azulada.

Sem perceber, o menino se aproximava de um quero-quero que cuidava do seu ninho.

O Pássaro o alertou com um grito estridente! Não se aproxime mais! O menino curioso, percebendo mas não compreendendo continuou, determinado. O pássaro se afastou dos seus ovos tentando trazer consigo a atenção daquela criatura. Ele esava acostumado a eles, mas não gostava muito dos pequenos. Eles eram impiedosos.

O menino mudou de direcão. Deu certo! O seguia… ele agora buscava distância-lo do ninho… Sua parceira estava distante e ele era encarregado de proteger…

O menino também conhecia aqueles pássaros, sabia da fama que tinham de atacar e também os respeitava. Buscou uma vara ou um pedaço de pau para se proteger. Ali, pensou. Havia avistado uma pilha de gravetos.

-Ele esta se aproximando do ninho! Alarmado alçou voo. Foi muito rápido. O menino ouviu o grito estridente enquanto alcançava a pilha de galhos, rapido sentiu o vento causado pelas asas.  Ele havia errado. Abaixou-se… pegou um galho fino e se preparou para um novo ataque… Ele está muito próximo. No retorno rasante da ave o menino o acertou em cheio. No chão ele se debatia. Com medo da perda da vida, do fracasso e da vergonha de ser abatido.

O menino, com medo que a ave o atacasse novamente, o agarrou pelo pescoço… não havia o que fazer.. o pássaro tremeu e morreu nas suas mãos…

Ao perceber o que havia feito, o menino ficou desolado. Colocou aquele corpo frágil e sem vida no chão. Olhou para as suas mãos e chorou. Pediu para que aquele ser voltasse a vida. Ficou assim até o sol nascer.

Os raios de sol começaram a ferir seus olhos. Colocou mão em concha para proteger-se e percebeu, ao lado daquela pilha de gravetos uma pequena depressão com dois ovos pequenos. Entendeu… mas era tarde.

Recolheu aquelas pequenas vidas com resignação.

Fechou a mao com cuidado. Ele completaria a tarefa. Nos dias que se passaram ele procurou tudo sobre os queros-queros. Colocou os ovos em uma caixa com algodão e uma lampada sobre ele para que chocassem. Dormia ao lado da caixa… Em alguns dias um ovo descascou. Um filhote havia nascido.

Ele havia completado a tarefa. Mas o que fazer agora?

Ele havia mudado a vida da pequena criatura. Ele poderia alimenta-lo mas nunca poderia ensina-lo a caçar.  Continuou… ele havia tirado uma vida e agora precisava devolver. No início não entendia o que aqueles trinados queriam dizer. Nem aqueles gestos com a cabeça. Mas observou e aprendeu. Em pouco tempo conseguia alimenta-lo no horário e praticamente entender o que cada som queria dizer. O pássaro crescia rápido, ficava cada dia mais parecido com seu pai. Um dia ele se descuidou e o pássaro saiu voando pela janela…

Ele procurou e procurou… reconheceria aquelas penas em qualquer lugar. Foi em vão. Ele nunca mais voltaria.

Mesmo sentindo a dor da separação ele percebeu que aquela era a hora… Conformado ele prosseguiu. Cresceu, namorou várias garotas, casou…

Aos vinte e tres anos descobriu que sua mulher estava grávida. Quando faltavam dois meses para o nascimento do seu filho, ele estava se exercitando pela manhã. O sol estava por nascer e ele lembrou daquele quero-quero… ainda podia entender o que os trinados significavam… ficou divagando… foi muito rápido. Quando deu por si já sentia o gosto de sangue na boca. O carro havia derrapado, estava parado a dez metros dele… ele não percebeu.. não lembrava… o sol, a luz, começou a ferir seus olhos… aquele trinado. E ele entendeu… seu filho cresceria. Não teria ele como pai, mas cresceria. Ele havia feito sua parte…

Tudo ficaria bem…

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Comentários

Uma resposta para “Reparação”

  1. Muito legal o texto!! Bacana mesmo! Parabens!